sexta-feira, 27 de julho de 2012

A LEI 12.619 É REALMENTE UM AVANÇO?

Veja a opinião dos sindicalistas sobre a nova lei, que está  gerando discussões, mas deve beneficiar os caminhoneiros.

“Já passou do tempo de nossos governantes criarem leis trabalhistas de proteção para uma categoria de suma importância para o desenvolvimento do Brasil. A profissão de caminhoneiro era uma das únicas que até hoje não era reconhecida. São mais de 55 anos, desde a implantação das primeiras fábricas de caminhões no Brasil, feita por Getúlio Vargas, que nós, caminhoneiros, não éramos reconhecidos como categoria profissional legalizada. Por isso, recebemos com grande satisfação a publicação da Lei 12.619, que além de assegurar mais direitos aos caminhoneiros, terá grande impacto na redução dos altos índices de acidentes nas estradas”, analisa Fredy Aurélio Fraile, do Sindicato dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens da Baixada Santista (Sindicam/Santos).

Na visão do sindicalista, as excessivas horas de direção, muitas vezes impostas pelas transportadoras, deixarão de existir com a nova legislação.

Para Fraile, o maior benefício que a Lei irá proporcionar é o exercício da profissão de forma mais digna “Não tínhamos tempo de direção, hora de almoço, direito de ir ao banheiro e nem tempo de descanso. Sem contar as péssimas condições das estradas e o grande risco de sermos assaltados. Sem dúvida, a nova legislação veio ao encontro de nossos anseios. A Lei determina repouso de 11 horas a cada 24 horas. Isso permitirá a esse profissional a dignidade de uma noite de sono, um direito de fundamental importância para qualquer ser humano. Além disso, a cada quatro horas dirigidas, o motorista terá direito a um descanso de 30 minutos, para que ele possa ir ao banheiro, esticar as pernas e tomar uma xícara de café. Uma hora de refeição, para que ele se alimente sem pressa e, finalmente, 36 horas de descanso semanal para que ele possa desfrutar com a família”, destaca Fraile.

José Araújo “China” da Silva, presidente da União Nacional dos Caminhoneiros do Brasil (Unicam), também compartilha da opinião do colega sindicalista. Ele avalia de forma positiva a criação da nova legislação.

“No início, obviamente que existem al¬gumas controvérsias, até que as empresas e profissionais consigam se adaptar à nova Lei. Mas o que não podia continuar acontecendo é o caminhoneiro ficar escravo de sua profissão. Todo trabalhador tem direitos, como jornada de trabalho definida, ganhos de hora extra e outros benefícios, que o caminhoneiro nunca teve. Por ter de se submeter a jornadas excessivas de trabalho, este profissional acaba tendo um desgaste muito maior, podendo se envolver em acidentes. Portanto, a Lei veio beneficiar não só o caminhoneiro, mas também toda a sociedade”, frisa China.

Para se ter ideia, levantamento feito pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) revelou que 35% dos acidentes do Brasil envolvem veículos de carga (que não chegam a 10% da frota em circulação no País) e que o percentual de mortes por acidentes de trânsito dobra das 20h às 5h.

Na visão do presidente da Unicam, a Lei 12.619 foi uma grande vitória da categoria, que pode esperar por mais melhorias. É que outro projeto de lei (271/08), do senador Paulo Paim (PT-RS), sugere con¬tribuições, como a inclusão do adicional de periculosidade e da garantia de aposenta¬doria especial após 25 anos de serviço. Segundo China, o projeto está em trâmite no Senado.

Divergências

Um dos pontos mais aplaudidos da legislação, mas também o que vem gerando mais controvérsias refere-se ao tempo de descanso e paradas: após uma jornada de quatro horas ao volante, o motorista terá de fazer uma parada de 30 minutos para descanso. Quem não obedecer será au¬tuado. A multa é R$ 127 e cinco pontos na Carteira de Habilitação.

O problema, segundo os sindicalistas, está justamente aí, uma vez que a presidente Dilma Rousseff vetou o artigo da Lei que exigia a construção de bases de apoio nas rodovias privatizadas. A justificativa do Governo foi o risco de aumento nas tarifas de pedágios.

“Sem pontos de parada, o cumpri¬mento da lei é inviável, já que o caminhoneiro não terá local adequado para descansar. Muito antes da regulamentação, eu já vinha me encontrando com redes de postos de gasolina, bem como com o Sindicato das Distribuidoras de Combustíveis, para falarmos da necessidade de melhorias nas instalações dos pos¬tos rodoviários, bem como da criação de estacionamentos”, revela China.

Segundo ele, também tramita no Senado Federal o Projeto de Lei 785/2011, que, se aprovado, obrigará as empresas concessionárias de rodovias federais a construir e manter estações de apoio aos motoristas de caminhão e de ônibus, a margem das estradas, preferencialmente ao lado de postos de combustíveis. O autor do projeto é o deputado federal Onofre Santo Agostini (PSD-SC).

Na visão de Fraile, um ponto importante da regulamentação é a criação do chamado “instituto de tempo de espera”. Isso significa que nos períodos em que os motoristas estiverem parados em barreiras fiscais “Balanças”, nas portas dos terminais portuários ou armazéns recebedores de cargas, que podem demorar para liberar os veículos, não será computado o tempo como hora extraordinária. “A remuneração do tempo de espera será, de acordo com a regra, de uma hora acrescida de 30%”, acrescenta.

Fraile esclarece que a lei não se aplica aos autônomos. “Seria necessário a criação de uma tabela de fretes, que seja respeitada em todo País, já que todos os segmentos de transportes têm uma tabela referencial de frete, táxi, ônibus, avião etc. Com isso, o ganho deste profissional garantiria sua sobrevivência e manutenção de seu caminhão, a fim de evitar o sucateamento de nossa frota e aumentar os níveis de segurança”, alerta o sindicalista.

Ele lembrou que a nova legislação só será aplicada a segmentos de transportes feitos por empresas transportadoras de cargas e transporte rodoviário de passageiros. “Nesse caso, nossa orientação é que o caminhoneiro autônomo, ao ser parado pela Polícia Rodoviária Federal, apre¬sente a documentação que prove que ele é um transportador autônomo: documento do caminhão em seu nome e o cartão da ANTT, que descrimina a atividade autôno¬ma. O importante é lembrar que o autôno¬mo é contratado pelas empresas, e no texto da Lei nada se refere à sua liberdade de atuação no transporte rodoviário de cargas autônomo. O autônomo é um prestador de serviços, que recolhe ISS, ele não é fun¬cionário da transportadora”, explica.

Otimismo

China, da Unicam, se mostra otimista com a nova legislação. Segundo ele, as empresas que se colocam contra a criação da lei devem avaliar melhor e entender que a regulamentação tem a aprovação de toda a sociedade.

“Ninguém quer ver um caminhoneiro dirigindo 25 horas sem dormir ou sem descansar. É algo desumano”, salienta.

Na opinião de Fraile, antes de se criar qualquer legislação é fundamental ouvir os protagonistas desta história. “Por mais que uma pessoa seja conhecedora de logística de transporte, ela jamais saberá o que é bom para uma categoria se nunca se sentou atrás de um volante de caminhão, ou nunca ficou dias e mais dias em estradas com barreira, chuva, neblina e falta de socorro. Infelizmente, só agora que o Brasil se lembrou que existe caminhão”, reclama Fraile.

Esperamos que daqui para frente a Lei torne-se realmente um avanço e ajude a reverter esse quadro, no sentido de que os motoristas sejam reconhecidos e valorizados por sua contribuição ao crescimento do Brasil.

Fonte: Editora na Boléia