Medidas elevam custos dos transportadores e indústria.
As restrições à circulação de caminhões foram a alternativa encontrada por prefeituras para tentar desafogar o trânsito nas vias de parte dos grandes centros brasileiros. A medida, no entanto, não é unânime. Por um lado, representantes de transportadores de carga reconhecem a melhora no fluxo de veículos em alguns pontos, mas, para outros, a iniciativa traz poucos resultados para o trânsito e ainda atinge em cheio as atividades de logística, contribuindo para o aumento do preço do frete.
Em São Paulo, um mês após a implantação da última restrição - que desde 05 de março proíbe o tráfego de caminhões na Marginal Tietê das 5h às 9h e das 17h às 22h em dias de semana, e das 10h às 14h nos sábados -, a prefeitura divulgou dados que atribuem à medida a diminuição da lentidão no trânsito. Os dados foram comparados ao mesmo período de 2011 e mostram redução da lentidão de 12,9% na cidade e de 23,9% na Marginal Tietê, na faixa entre 7h e 9h. No ano passado, mais de 2 mil caminhões passavam a cada hora na Marginal (em horário de pico), segundo o levantamento, contra o máximo de 800 após a proibição. O estudo ainda mostra que mais carros passaram a utilizar a via, um aumento de 18% em relação a 2011. No horário de entrepico (das 9h às 17h), contudo, a Marginal ganhou 3,9% em lentidão - a cidade, no total, obteve redução de 5,1%.
Para o presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas de São Paulo e Região (Setcesp), Francisco Pelucio, os caminhões não são a principal causa dos problemas de mobilidade. Ele admite que é preciso tomar atitudes para melhorar a fluidez do trânsito, mas acrescenta que tais imposições só transferem os congestionamentos para os períodos permitidos à circulação de caminhões. O presidente da NTC&Logística, Flávio Benatti, também opina que as restrições não são a solução. “A falta de mobilidade urbana nos grandes centros é resultado da falta de planejamento dos nossos administradores públicos”, afirma. Para o consultor em engenharia de tráfego Horácio Ferreira, todas as vias têm capacidade determinada, e entre 80% e 90% dela vem sendo ocupados por automóveis. “Procura-se fora do problema a causa dele. Dizer que a culpa é do caminhão é atestar que é hora de voltar para os bancos escolares, aprender o que é engenharia do transporte”, afirma. Ferreira ainda chama a medida de “confusão logística” que beneficia não o transporte coletivo, mas somente automóveis particulares.
O golpe é sentido pelas empresas de transporte de cargas. “O setor produtivo, que gera o desenvolvimento econômico, acaba sendo prejudicado”, constata Benatti. O presidente do Setcesp aponta que o preço do frete na capital paulista aumentou entre 15% e 20% apenas este ano, após a restrição na Marginal Tietê. “Quem paga também é a população”, adverte Pelucio, indicando que esses valores podem ser repassados ao consumidor final dos produtos transportados.
Para driblar as proibições, Pelucio explica que muitas empresas têm criado centros de distribuição em cidades próximas para poder receber os caminhões e realocar as cargas em veículos menores. Algumas optam por mudar o horário das entregas, mas há também as que assumem as multas. “O transporte de carga tem de se readaptar, ele tem seus compromissos. Uma multa de contrato é muito maior”, diz o presidente do Setcesp.
Horário inverso
Investir em um sistema otimizado de entrega de cargas é a opção vista pelo vice-presidente do Sindicato das Empresas de Transporte Rodoviário de Cargas e Logística do Rio de Janeiro (Sindicarga), Silvio Ferreira de Carvalho Junior. Atualmente, ele estima que a dificuldade para se locomover dentro da cidade diminuiu em mais da metade a capacidade de entregas de uma transportadora. Por isso, Carvalho Junior entende que o caminhão não pode mais conviver com o tráfego normal diário dos grandes centros e aposta que as cidades devem se preparar para o que chama de “revolução na logística do transporte”: a inversão dos horários, com entregas durante a noite e a madrugada para melhorar a dinâmica.
A medida, prevê a entidade, desafogaria o trânsito, oferecendo conforto à população, melhorias no rendimento das transportadoras e diminuição de custo. “Defendemos esse movimento, mas a entidade pública tem que tomar a iniciativa. Não há como descarregar a carga se o comerciante não abre”, ressalva Carvalho Junior, indicando a necessidade de modificar a cultura dos comerciantes. Na prática, a mudança resultaria em uma redução de 20% nos congestionamentos, estima o vice-presidente do Sindicarga. O consultor em engenharia de tráfego Horácio Ferreira, entretanto, encara a alternativa com reservas. Apesar de grandes transportadoras já efetuarem a recepção de carga noturna, ele aponta brechas estruturais e de segurança que poderiam comprometer o modelo. “A maioria dos pontos comerciais não têm nem nunca terá estrutura para manter um porteiro 24 horas”, diz.
Fonte: Cartola/Terra