A obrigatoriedade
existe desde 1933, quando nem cabines-leito existiam.
Quando a Paccar americana tentou trazer ao mercado
brasileiro o seu modelo pesado Kenworth, o português de nascimento, Antônio da
Cunha, declarou à Revista Veículo (descontinuada no final de 2006) que “as
características do transporte rodoviário [de carga] daqui são semelhantes às
dos EUA”. Sua opinião foi publicada em maio de 1995, a partir da convicção de
que ele tinha autoridade para o dito, já que estava há 13 anos na montadora
americana e exercia o cargo de diretor de Marketing corporativo.
Os seus planos não foram à frente, mas a comparação de
lá-com-cá ficou. Há quem discorde. Principalmente pela diferença de valores do
frete, das remunerações do motorista, do agregado, etc. Para não aprofundar no
debate, cabe o escape pelas laterais, tipo ‘ele acertou no atacado e errou no
varejo’. Agora, por exemplo, da Cunha está certo. Também nos EUA, pega fogo a
controvérsia sobre as alterações às regras de descanso dos motoristas de
caminhão. À propósito, é preciso destacar que a obrigatoriedade de dormir
existe desde 1933, quando nem cabines-leito existiam. Ao longo desse tempo, a
norma passou por várias alterações. A mais recente exigia mais tempo para
dormir. Após disputada queda de braço, esta alteração foi aprovada pelo
Congresso americano em junho de 2013 e levou o nome de 34 horas de restart
(recomeço).
Uma complicada re-regulamentação do tempo de parada dos
condutores, que ia ao detalhe de impedir o despertar e partida dos
profissionais entre 1 e 5 horas da madrugada, pós-período das tais 34 horas.
Exigência deveria ser cumprida duas vezes a cada semana. Na época, a ATA tentou
impedir a sua aprovação. Alegou perda de produtividade, já que impedia o chofer
de tocar direto por mais de 50 horas semanais, conforme Bill Graves, presidente
da entidade. O mesmo tinha mais críticas à mexida dos parlamentares. Essa de
não poder começar a tocada pela alta madrugada – entre 1 e 5 horas –, acumulava
todo mundo na estrada ao mesmo tempo, coincidindo com os picos do rush
matutino, também de carros.
Mas afinal, a ATA conseguiu reverter toda a legislação de
menos horas ao volante (em inglês HOS = hours of service). Suas cláusulas foram
suspensas em meados de dezembro do ano passado, pelo mesmo Congresso, graças ao
empenho lobista da ATA. Por outro lado, derrotou interesses e cuidados de muita
gente, inclusive do próprio secretário (ministro) dos Transportes, Anthony
Foxx. A agência federal de segurança do caminhonismo (FMCSA) também está contra
e sempre argumentou que as regras das 34-horas restart visavam “a segurança
porque o sono noturno descansa mais do que o diurno”. Daí a proibição de fazer
madrugada durante toda a semana.
As exigências de 2013 foram suspensas em dezembro, em favor
da versão anterior. Esta admite menores restrições quanto ao tempo de direção.
Já a agência FMCSA tem prazo para apresentar novo estudo até setembro deste
ano. Nele poderá ser comparado o comportamento dos profissionais sob as regras
suspensas e as anteriores, considerando-se o critério básico – e não
trabalhista – que é a ocorrência de colisões entre os dois grupos de
motoristas. No Brasil, forças do caminhonismo pátrio querem modificar a nossa
tão discutida Lei 12.619, do descanso obrigatório. Por outro lado, encontra
resistência de oponentes, que defendem a jornada de trabalho e o tempo de
direção, conforme limita a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em vigor
desde os anos 1940. Mais uma vez da Cunha acerta quanto à coincidência de
rumos. Lá (com base em 1933) e cá a luta é para garantir a prevalência do
passado. Só que de sinais trocados: o TRC americano quer a lei frouxa; nós aqui
procuramos arrochá-la.
Fonte: Carga Pesada