Com novos sistemas, ZF transforma manobra de carreta em
videogame
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Bitrem de 25 metros pode ser manobrado com aponta do dedo em um tablet. |
A operação de manobrar carretas longas em espaços apertados traz estresse ao
motorista e riscos de danos. Não mais após uma boa dose da sempre criativa
engenharia automotiva alemã. Quem visitar o próximo Salão de Veículos
Comerciais de Hannover (o IAA Nutzfahrzeuge), na Alemanha, poderá manobrar como
se fosse um videogame um enorme conjunto biarticulado de cavalo mecânico e
bitrem, de pouco mais de 25 metros de comprimento e 40 toneladas de carga. Tudo
por controle remoto, ao simples toque do dedo indicador sobre um tablet. E sem
emitir gases de escape, pois a manobra é impulsionada por motor elétrico
acoplado à transmissão.
A invenção é da ZF, que aplicou em um caminhão híbrido
protótipo uma
série de novas tecnologias que permite o atrevimento futurístico. Mais do que
demonstração lúdica, a intervenção revela o alto potencial da eletrônica para
tornar veículos pesados mais leves de dirigir do que um quadriciclo, além de
trazer maior segurança e economia de combustível.
A ZF mostrou seus mais novos sistemas para veículos comerciais no início de
julho em um campo de provas na pequena Aachen, cidade sede do império de Carlos
Magno na Idade Média, no Oeste da Alemanha, ao lado da fronteira com a Holanda,
onde algumas dessas tecnologias são desenvolvidas em convênio com a
universidade local, referência em engenharia da mobilidade. Trabalhando em
conjunto no Innovation Truck ou em separado, os principais destaques são o
câmbio automatizado modular TraXon, que funciona tanto em caminhões com
propulsão diesel convencional como tem também uma versão que agrega motor
elétrico para veículos híbridos; e a direção eletro-hidráulica Servotwin – esta
desenvolvida pela ZF Lenksysteme, joint venture em partes iguais da ZF com a
Bosch. Tudo com muita inteligência artificial.
“A influência dos softwares deve mudar a face da indústria e seus domínios
clássicos”, confirma Fredrik Staedtler, vice-presidente executivo sênior da ZF
Friedrichafen AG responsável pela divisão de desenvolvimento de tecnologia para
veículos comerciais. Ele destaca que os fabricantes de caminhões seguem
tendências antagônicas: ao mesmo tempo em que precisam oferecer diferenciações
aos clientes que incluem redução do custo de propriedade, robustez, maior
eficiência energética e eletrificação do powertrain, também não podem perder de
vista a economia de escala. A eletrônica usada na mecânica pesada traz à tona
novas possibilidades tecnológicas para atender esses fatores competitivos. “Os
fornecedores devem oferecer essa diferenciação e, ao mesmo tempo, colocar
diversos fabricantes no mesmo cesto para ganhar escala de produção e reduzir os
custos das novas funcionalidades”, avalia.
INTEGRAÇÃO TECNOLÓGICA
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Graças à integração de transmissão híbrida com motor elétrico, direção eletro-hidráulica e sistema de telemática (direita), o motorista pode comandar a manobra do caminhão do lado de fora da cabine, por meio de um tablet (esquerda), onde ele vê imagens das câmeras, escolhe se quer ir para frente ou para trás e dirige a carreta com o dedo indicador na tela (no centro). |
O ZF Innovation Truck, que estará exposto no IAA no fim de setembro próximo, é
um exemplo de integração de tecnologias existentes que projetam o futuro. O
protótipo aglutina os novos sistemas de direção assistida eletro-hidráulica
Servotwin e transmissão automatizada híbrida TraXon Hybrid com motor elétrico,
ambos controlados por uma central eletrônica com programa de telemática
desenvolvido pela Openmatics.
Ao trabalhar em conjunto, os sistemas abrem caminho para uma rápida evolução
dos caminhões, incluindo a condução autônoma, em que o veículo poderá rodar sem
a interferência do motorista. Mas essa é uma rota mais longa. Por enquanto, o
que se quer mostrar são as possibilidades tecnológicas já ao alcance das mãos.
“Com o nosso Innovation Truck, ilustramos o potencial adicional de tecnologias
conhecidas. Idealizamos funções de assistência completamente novas que são
eficientes e, ao mesmo tempo, simples de adotar”, resume Stefan Sommer, CEO da
ZF.
Direção e transmissão controlados eletronicamente tornam possível o controle
remoto das manobras em um tablet. O câmbio TraXon Hybrid aciona o motor
elétrico de 160 cavalos. As baterias também alimentam o sistema
eletro-hidráulico de direção Servotwin, que recebe comandos da central
eletrônica acionada tanto pelo volante como por um tablet, do lado de fora da
cabine. O motorista pode ficar ao lado do caminhão para ter melhor visão da
manobra. Ele escolhe se quer manobrar para frente ou para trás e arrasta o dedo
na tela do tablet no sentido que deseja movimentar o veículo. O programa
calcula automaticamente o quanto o volante deve esterçar, tornando a operação
uma brincadeira de criança em comparação com o esforço e atenção exigidos para
estacionar um bitrem. Para parar, é só tirar o dedo da tela. E para evitar
acidentes o implemento é equipado com câmeras em todas as extremidades, que mostram
as imagens no tablet e acionam os freios caso qualquer obstáculo seja
detectado.
Além de tornar tudo mais simples, o sistema evita emissão de poluentes e gasto
de combustível durante as manobras. No futuro, os técnicos da ZF avaliam que
será possível deixar o caminhão na entrada do armazém para carga ou descarga e
simplesmente acionar um programa de estacionamento automático, em que o veículo
se dirige sozinho para sua doca por um caminho pré-estabelecido.
DIREÇÃO ELETRIFICADA
Assim como já acontece nos carros, a eletrificação de sistemas também é uma
tendência nos caminhões para economizar combustível. Contudo, as forças
envolvidas são bem diferentes. “A direção com assistência elétrica tem bom
potencial para aumentar a economia em caminhões, mas em um veículo pesado o
motor elétrico de assistência precisa fazer mais força e isso requer voltagem
maior, o que não é possível com baterias comuns”, explica Walter Kogel, diretor
de desenvolvimento de sistemas de direção da ZF Lenksysteme. “Mas estamos evoluindo
para esse caminho”, completa.
A mais recente evolução nesse caminho foi batizada de Servotwin, a primeira
direção eletroassistida do mundo para caminhões pesados. Em um veículo híbrido
como o Innovation Truck da ZF, a voltagem maior não é problema, pois já existe
um sistema de baterias de alta tensão. Porém, usar assistência puramente
elétrica reduz mais rapidamente a carga das baterias. Com a Servotwin, que
também pode ser usada com propulsão convencional, isso não acontece porque o
mecanismo é eletro-hidráulico. Em vez de usar a força do motor, a bomba
hidráulica de óleo é acionada por um pequeno motor elétrico que consome pouca
energia. Em comparação com a assistência hidráulica pura, é possível obter
redução de consumo de até 0,6 litro de diesel a cada 100 km rodados, segundo
testes feitos pela ZF.
Na prática, a direção eletroeletrônica não só deixa as manobras muito precisas
e confortáveis (é possível esterçar totalmente o volante com um dedo), mas
também pavimenta o caminho para a integração de modernos sistemas autônomos de
assistência ao motorista. Entre eles estão funções de compensação automática de
vento lateral e retomada do rumo correto quando o veículo “desgarra”
acidentalmente da faixa de rodagem (Lane Keeping Assistance). No futuro
próximo, de acordo com a vontade das fabricantes de caminhões, será possível
agregar sistemas de direção parcialmente autônoma, para manobras ou operações
de acoplamento e desacoplamento de implementos, por exemplo. Mais adiante
ainda, o módulo de controle poderá ser operado por computador, para condução
sem interferência do motorista.
HÍBRIDO DE LONGA DISTÂNCIA
A utilização de trem-de-força elétrico em veículos comerciais tem se limitado a
furgões e caminhões leves para distribuição urbana de mercadorias, pois as
baterias até o momento não têm autonomia para longas distâncias ou alimentar
motores de alta potência de cavalos mecânicos que puxam mais de 40 toneladas de
carga. Com seu Innovation Truck, a ZF quebra esse paradigma ao aplicar pela
primeira vez a hibridização elétrica em um caminhão pesado, com um motor
elétrico de 160 cavalos acoplado ao câmbio que funciona em paralelo à propulsão
diesel.
“Estudos de nossa equipe de engenharia comprovam que o uso de powertrain
híbrido em caminhões pesados tem potencial considerável de economia, com
redução de consumo acima de 5%”, diz Winfried Gründler, responsável pelo
desenvolvimento de tecnologias de rodagem para caminhões e furgões da ZF. “É
verdade que 5% é bem menos do que a economia obtida por híbridos no tráfego
urbano (em torno de 20%), mas é preciso considerar que a quilometragem e o
consumo dos veículos pesados são muito maiores. Por isso a tecnologia híbrida é
uma solução que pode se pagar em curto período”, avalia.
A transmissão automática acoplada ao motor elétrico TraXon Hydbrid foi
desenvolvida pela ZF como um módulo, para ser instalado em caminhões pesados
sem necessidade de grandes mudanças em projetos já existentes. A tração
puramente elétrica é utilizada para manobras (como visto no Innovation Truck)
ou em outras situações de baixa velocidade – quando o veículo passa por cidades
e roda lentamente no trânsito, por exemplo. O motor elétrico também funciona
como um impulsor de torque para fazer o veículo ganhar velocidade mais
rapidamente – o que permite o uso de um propulsor diesel menor e mais
econômico.
O sistema recupera a energia cinética das frenagens, para recarregar as
baterias, e agrega funções start-stop e coasting, que desliga o motor diesel
nas paradas ou em velocidade constante. Nesta situação, as rodas em movimento
se transformam em gerador. Com o caminhão em movimento ou parado, para poupar
diesel a energia gerada pelo motor elétrico e armazenada nas baterias pode ser
direcionada a implementos refrigerados ou equipamentos de cabine, como rádio,
sistema de som, navegação e ar-condicionado.
TRANSMISSÃO MODULAR
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TraXon, a nova transmissão automatizada da ZF e seus cinco módulos diferentes: básico com embreagem simples, embreagem dupla, híbrida com motor elétrico acoplado, conversor de torque e tomada de força (PTO). Para caminhões de longo curso, a TraXon Dual faz as mudanças sem perda de rotação e aumenta a economia de combustível. |
Impressiona a versatilidade da transmissão automatizada modular TraXon, uma
evolução da AS Tronic com redução de ruído e dimensões. São cinco módulos
diferentes para o mesmo câmbio, dependendo da aplicação. Além da opção híbrida
com motor elétrico, existem quatro outras versões com para utilização em
motorização diesel convencional: TraXon básica de 12 ou 16 velocidades, Dual
(embreagem dupla), Torque (conversor para marchas reduzidas) e PTO (tomada de
força).
De acordo com a ZF, a TraXon básica já garante economia de 4% a 5% em relação
ao câmbio manual. Para caminhões pesados de longo percurso que adotam a
tendência de relações de marchas longas, para reduzir o consumo por meio da
menor velocidade de rotação do motor, a ZF desenvolveu a versão Dual. É a
primeira transmissão automatizada para caminhões pesados a usar embreagem
dupla, que torna as mudanças de marchas muito mais rápidas e precisas.
Praticamente não há “buracos” entre as trocas e o giro permanece constante. Sem
perda de rotação, não é preciso acelerar para retomar o torque e a economia
aumenta ainda mais, em torno de 7% na comparação com câmbio manual e de 3% a 4%
em relação à TraXon básica.
No caso de aplicações de grande esforço, como mineração e construção civil, foi
desenvolvida a versão TraXon Torque, com módulo entre o motor e o câmbio capaz
de converter baixas rotações do motor em elevado torque para vencer aclives e
terrenos irregulares. Para implementos que precisam da energia gerada pelo
motor, como basculantes, lixeiros ou caminhões bombeiros, existe o módulo PTO
(tomada de força) acoplado à transmissão.
Em todas as versões, a TraXon pode ser programada com o PreVision GPS, uma
plataforma que une a central eletrônica de comando da transmissão com dados de
navegação por satélite. Informações sobre a rota, como subidas, descidas,
curvas e limites de velocidade, são consideradas para traçar uma estratégia de
trocas de marchas no percurso, para privilegiar a economia, evitando-se
reduções desnecessárias, por exemplo. Dessa forma, a força bruta dos pesados
está cada vez mais inteligente.
Fonte: Automotive Business